terça-feira, 31 de janeiro de 2012

PARECER CNE/CEB Nº 39/2004

PARECER CNE/CEB Nº 39/2004

Aplicação do Decreto nº 5.154/2004 na Educação Profissional Técnica de nível
médio e no Ensino Médio.

I – RELATÓRIO
Em 10/11/2004, foi protocolado no CNE o Ofício nº 5.494/04, da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica, nos seguintes termos: “Esta Secretaria tem recebido constantes consultas de instituições ofertantes de Educação Profissional e Tecnológica referentes à aplicação do Decreto Nº 5.154,
de 23 de julho de 2004, especialmente quanto à Educação Profissional Técnica de nível médio”.

O Decreto nº 5.154/2004 revogou o Decreto nº 2.208, de 17 de abril de 1997, e definiu novas orientações para a organização da Educação Profissional.
Em relação à Educação Profissional técnica de nível médio este Decreto prevê três alternativas de organização. Uma delas é a forma integrada com o Ensino Médio, a qual não estava contemplada na Resolução CNE/CEB nº 04/99 e proibida na Resolução CNE/CEB nº 03/98, ambas desse Conselho.
Em função desta nova realidade ditada pelo Decreto nº 5.154/2004, solicito, em caráter de urgência, manifestação da Câmara de Educação Básica desse Colegiado, com vistas à adequação das Diretrizes Curriculares Nacionais no que se refere à Educação Profissional Técnica de nível médio, permitindo, como conseqüência, orientar os sistemas de ensino e as escolas na imediata implantação do referido Decreto, a partir do próximo ano letivo”.
No último dia da reunião ordinária da Câmara de Educação Básica do mês de novembro, a CEB debateu exaustivamente uma primeira proposta de parecer e de resolução sobre a matéria. Essa proposta, refeita, foi apresentada na reunião conjunta do Conselho Nacional de Educação com o Fórum Nacional de Conselhos Estaduais de Educação, em Porto Alegre, e buscou-se dar ampla divulgação aos mesmos, para que os interessados pudessem encaminhar suas sugestões. É oportuno ressaltar a excelência e a qualidade das inúmeras sugestões recebidas pelo relator por parte dos Conselhos Estaduais de Educação, representantes do
MEC, representantes de instituições de Educação Profissional públicas e privadas, especialistas em Educação Profissional atuantes nas universidades e nas instituições de Educação Profissional. Na oportunidade em que o relator agradece todas essas contribuições, informa que todas elas foram atentamente analisadas e levadas em consideração.

Mérito
A Lei nº 9.394/96, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, trata o tema da “Educação Profissional” em um capítulo especial, o Capítulo III do Título V, “Da Educação Profissional”, Artigos 39 a 42, de forma associada e articulada com o § 2º
do Artigo 36 da mesma Lei, na parte referente ao Ensino Médio, definido como “etapa final da Educação Básica, com duração mínima de três anos”.
No Artigo 39, a Educação Profissional é claramente caracterizada como “integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia”, com o objetivo de conduzir o cidadão a um permanente desenvolvimento “de aptidões para a vida produtiva” na sociedade do trabalho e do conhecimento.
O Ensino Médio, no Artigo 35, é claramente caracterizado como a “etapa final da Educação Básica”, com a finalidade de “consolidação e aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos, a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores; o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluída a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico; a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a
prática, no ensino de cada disciplina”.
O Ensino Médio ganhou uma clara identidade própria e a Educação Profissional também. Não é mais possível colocar a Educação Profissional no lugar do Ensino Médio, como se ela fosse uma parte do mesmo, como o fizera a revogada Lei nº 5.692/71. A Educação Profissional será sempre uma “possibilidade” para o “aluno matriculado ou egresso do Ensino Fundamental, Médio e Superior”, bem como ao “trabalhador em geral, jovem ou adulto” (Parágrafo Único do Artigo 39) e “será desenvolvida em articulação com o ensino regular ou por diferentes estratégias de educação continuada, em instituições especializadas ou no ambiente de trabalho” (Artigo 40).
A “articulação” é a nova forma de relacionamento entre a Educação Profissional e o Ensino Médio. Não é mais adotada a velha fórmula do “meio a meio” entre as partes de educação geral e de formação especial no Ensino Médio, como havia sido prevista na reforma ditada pela Lei nº 5.692/71. “Todos os cursos do Ensino Médio terão equivalência legal e habilitarão ao prosseguimento de estudos” (§3º do Artigo 36). O preparo “para o exercício de profissões técnicas”, no Ensino Médio, só ocorrerá desde que “atendida a formação geral do educando” (§ 2º do Artigo 36).
O § 4º do Artigo 36 faz uma clara distinção entre a obrigatória “preparação geral para o trabalho” e a facultativa “habilitação profissional” no âmbito do Ensino Médio, as quais poderão ser desenvolvidas nos próprios estabelecimentos de ensino ou em cooperação com instituições especializadas em Educação Profissional. Essa nova forma de relacionamento entre o Ensino Médio e a Educação Profissional foi caracterizada, no Inciso I do Artigo 3º da Resolução CNE/CEB 4/99, como de “independência e articulação”.
Essa orientação marcou as Diretrizes Curriculares Nacionais definidas pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação tanto para o Ensino Médio (Parecer CNE/CEB 15/98 e Resolução CNE/CEB 3/98) quanto para a
Educação Profissional de Nível Técnico (Parecer CNE/CEB 16/99 e Resolução CNE/CEB 4/99) e a Educação Tecnológica (Parecer CNE/CP 29/2002 e Resolução CNE/CP 3/2002).
As Diretrizes Curriculares Nacionais definidas pelo Conselho Nacional de Educação tanto para o Ensino Médio quanto para a Educação Profissional de nível técnico, assim como as Diretrizes Curriculares Nacionais gerais definidas pelo mesmo Conselho para “a organização e o funcionamento dos cursos superiores de tecnologia” continuam perfeitamente válidas após a edição do Decreto nº 5.154/2004. As Diretrizes Curriculares Nacionais definidas pelo Conselho Nacional de Educação não deverão ser substituídas. Elas não perderam a sua validade e eficácia, uma vez que regulamentam dispositivos da LDB em plena vigência. O que
será necessário fazer é uma ou outra alteração nas respectivas resoluções definidoras de Diretrizes Curriculares Nacionais, definindo orientação complementar referente a eventuais pontos de divergência de interpretação ou de organização entre as orientações básicas do revogado Decreto nº 2.208/97 e do vigente Decreto nº 5.154/2004.
As divergências entre os dois decretos regulamentadores, que merecem ser explicitadas e corrigidas no conjunto das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio e para a Educação Profissional Técnica de nível médio, são as seguintes:
- O Decreto nº 2.208/97 organizava a Educação Profissional em três níveis:
Básico, Técnico e Tecnológico (Cf. Artigo 3º). O Decreto nº 5.154/2004 define que a
Educação Profissional “será desenvolvida por meio de cursos e programas de
formação inicial e continuada de trabalhadores; Educação Profissional Técnica de
nível médio; e Educação Profissional Tecnológica, de graduação e de pósgraduação”
(Cf. Artigo 1º).
- O Artigo 5º do Decreto nº 2.208/97 define que “a Educação Profissional de
nível técnico terá organização curricular própria e independente do Ensino Médio,
podendo ser oferecida de forma concomitante ou seqüencial a este”. O Decreto nº
5.154/2004, por seu turno, define que “a Educação Profissional Técnica de nível
médio (...) será desenvolvida de forma articulada com o Ensino Médio” (Cf. Artigo
4º), e que esta articulação entre a Educação Profissional Técnica de nível médio e o
Ensino Médio “dar-se-á de forma integrada, concomitante e subseqüente ao Ensino
Médio” (Cf. incisos I, II e III do § 1º do Artigo 4º).
- O Parágrafo Único do Artigo 5º do Decreto nº 2.208/97 estabelecia um limite,
de 25% do total da carga horária mínima do Ensino Médio para “aproveitamento no
currículo da habilitação profissional”. O Decreto nº 5.154/2004 não prevê mais esse
limite previsto pelo Decreto nº 2.208/97, que constituía, na prática, uma clara
herança da mentalidade ditada pela Lei nº 5.692/71;
- o Decreto nº 2.208/97, no seu Artigo 6º, definia uma estratégia para a
“formulação dos currículos plenos dos cursos do ensino técnico”, que já fora
superada pelas atuais Diretrizes Curriculares Nacionais definidas pelo Conselho
Nacional de Educação, de forma coerente com as diretrizes da Lei nº 9.394/96 e
com o que acabou sendo estabelecido sobre a matéria pelo Decreto nº 5.154/2004,
em seus Artigos 5º e 6º;
- as orientações definidas nos Artigos 8º e 9º do Decreto nº 2.208/97 também
foram devidamente interpretadas pelas Diretrizes Curriculares Nacionais definidas
pelo Conselho Nacional de Educação, as quais mantêm maior coerência com o que
dispõe sobre a matéria o recente Decreto nº 5.154/2004;
- o referido Decreto, no seu Artigo 4º, define como premissas básicas a serem
observadas na organização da Educação Profissional Técnica, de forma articulada
com o Ensino Médio, que sejam observados “os objetivos contidos nas Diretrizes
Curriculares Nacionais definidas pelo Conselho Nacional de Educação; as normas
complementares dos respectivos sistemas de ensino; e as exigências de cada
instituição de ensino, nos termos do seu projeto pedagógico” (incisos I, II e III do
Artigo 4º).
Assim, as principais complementações exigidas, em termos de Diretrizes
Curriculares Nacionais para o Ensino Médio e para Educação Profissional Técnica
de nível médio, de forma a possibilitar a sua plena articulação, nos termos definidos
pelo Decreto nº 5.154/2004, isto é, nas formas integrada, concomitante e
subseqüente, são as seguintes:
- inclusão de um § 3º no Artigo 12 da Resolução CNE/CEB 3/98, explicitando
o exato significado do § 2º do mesmo Artigo;
- alteração da redação do Artigo 13 da Resolução CNE/CEB 3/98, de modo a
possibilitar a forma integrada de articulação entre a Educação Profissional Técnica
de nível médio e o Ensino Médio.
Além dessas duas alterações básicas, complementando as orientações
exaradas pela Câmara de Educação Básica nos Pareceres CNE/CEB 15/98 e
CNE/CEB 16/99, torna-se necessário apenas atualizar essas diretrizes às
disposições do Decreto nº 5.154/2004, em termos de orientação aos sistemas de
ensino e às instituições de Educação Profissional e demais estabelecimentos de
ensino na implementação de cursos e programas de Educação Profissional Técnica
de nível médio em articulação com o Ensino Médio.
A Educação Profissional Técnica de nível médio será desenvolvida de forma
articulada com o Ensino Médio (Decreto nº 5.154/2004, Artigo 4º). Nessa articulação,
os sistemas e os estabelecimentos de ensino deverão observar o seguinte:
1. “os objetivos contidos nas Diretrizes Curriculares Nacionais definidas pelo
Conselho Nacional de Educação” (Inciso I do Artigo 4º);
2. “as normas complementares dos respectivos sistemas de ensino” (Inciso II do
Artigo 4º);
3. “as exigências de cada instituição de ensino, nos termos do seu projeto
pedagógico” (Inciso III do Artigo 4º);
4. “a organização curricular por áreas profissionais, em função da estrutura
sócio-ocupacional e tecnológica” (Inciso I do Artigo 2º);
5. “a articulação dos esforços das áreas da educação, do trabalho e emprego, e
da ciência e tecnologia” (Inciso II do Artigo 2º).
De acordo com o § 1º do Artigo 4º do Decreto nº 5.154/2004, as formas
possíveis de concretização dessa “articulação entre a Educação Profissional Técnica
de nível médio e o Ensino Médio” são as seguintes:
1. Integrada (inciso I do § 1º do Artigo 4º): “oferecida somente a quem já tenha
concluído o Ensino Fundamental, sendo o curso planejado de modo a
conduzir o aluno à habilitação profissional técnica de nível médio, na mesma
instituição de ensino, contando com matrícula única para cada aluno”. A
instituição de ensino, porém, deverá, “ampliar a carga horária total do curso, a
fim de assegurar, simultaneamente, o cumprimento das finalidades
estabelecidas para a formação geral e as condições de preparação para o
exercício de profissões técnicas” (§ 2º do art. 4º).
2. Concomitante (inciso II do § 1º do Artigo 4º): “oferecida somente a quem já
tenha concluído o Ensino Fundamental ou esteja cursando o Ensino Médio” e
com “matrículas distintas para cada curso”. Esta forma poderá ocorrer em três
situações distintas, as quais já eram possíveis na vigência do Decreto nº
2.208/97:
2.1. na mesma instituição de ensino (alínea “a” do inciso II do § 1º do Artigo
4º): neste caso, embora com matrículas distintas em cada curso, a articulação
será desenvolvida nos termos da proposta político-pedagógica do
estabelecimento de ensino;
2.2. em instituições de ensino distintas (alínea “b” do inciso II do § 1º do Artigo
4º): neste caso, é o aluno que faz a complementaridade entre o Ensino Médio
e a Educação Profissional de nível médio, aproveitando-se das oportunidades
educacionais disponíveis;
2.3. em instituições de ensino distintas, porém, com convênio de
intercomplementaridade (alínea “c” do inciso II do § 1º do Artigo 4º): neste
caso, as matrículas são distintas, mas os dois cursos são desenvolvidos
articuladamente, como um único curso, em decorrência do planejamento e
desenvolvimento de projetos pedagógicos unificados entre as escolas
conveniadas.
3. Subseqüente (inciso III do § 1º do Artigo 4º): “oferecida somente a quem já
tenha concluído o Ensino Médio”. Esta alternativa estava prevista no Decreto
nº 2.208/97 como “seqüencial” e teve a sua denominação alterada pelo
Decreto nº 5.154/2004, acertadamente, para evitar confusões com os “cursos
seqüenciais por campo do saber, de diferentes níveis de abrangência”,
previstos no inciso I do Artigo 44 da LDB, no capítulo da Educação Superior.
A instituição poderá adotar qualquer uma das três formas previstas no
Decreto nº 5.154/2004, na realidade, cinco, com o desdobramento em três da forma
“concomitante”. O decreto não obriga, portanto, por uma ou outra, cabendo à
instituição de ensino, no uso de sua autonomia, decidir pela forma que melhor se
coaduna com sua proposta político-pedagógica.
A articulação entre a Educação Profissional Técnica de nível médio e o
Ensino Médio, tanto na forma integrada, quanto na forma concomitante, na mesma
instituição de ensino ou em instituições distintas, mas integradas por convênio de
intercomplementaridade e projeto pedagógico unificado, poderá ocorrer tanto em
articulação com o Ensino Médio regular, quanto com os cursos de Educação de
Jovens e Adultos de Ensino Médio, objetivando, simultaneamente, “a qualificação
para o trabalho e a elevação do nível de escolaridade do trabalhador” (Cf. Artigo 3º,
§ 2º).
Embora possa parecer desnecessário, é preciso ressaltar que a forma
integrada não pode ser vista, de modo algum, como uma volta saudosista e simplista
à da revogada Lei nº 5.692/71. Para a nova forma introduzida pelo Decreto nº
5.154/2004, é exigida uma nova e atual concepção, que deverá partir do que
prescreve o § 2º do Art. 4º do referido Decreto.
Na hipótese do estabelecimento de ensino utilizar a forma integrada, o
mesmo deverá “assegurar, simultaneamente, o cumprimento das finalidades
estabelecidas para a formação geral e as condições de preparação para o exercício
de profissões técnicas” (§ 2º do Artigo 4º do Decreto nº 5.154/2004), deverá
observar tanto as Diretrizes Curriculares Nacionais definidas pelo Conselho Nacional
de Educação para o Ensino Médio pelo Parecer CNE/CEB 15/98 e Resolução
CNE/CEB 3/98, quanto as Diretrizes Curriculares Nacionais definidas para a
Educação Profissional Técnica de nível médio, pelo Parecer CNE/CEB 16/99 e
Resolução CNE/CEB 4/99, bem como as Diretrizes Curriculares Nacionais definidas
para a Educação de Jovens e Adultos, pelo Parecer CNE/CEB 11/2000 e Resolução
CNE/CEB 1/2000,
A Educação Profissional Técnica de nível médio não pode tomar o lugar do
Ensino Médio. Disto não resta a menor dúvida. “A carga horária mínima anual, (...)
de oitocentas horas, distribuídas por um mínimo de duzentos dias de efetivo trabalho
escolar”, conforme reza o Inciso I do Artigo 24 da LDB, deve ser dedicada
exclusivamente ao atendimento das finalidades estabelecidas pelo Artigo 35 da LDB
para “o Ensino Médio, etapa final da educação básica, com duração mínima de três
anos”, observadas as diretrizes definidas no Artigo 36 da mesma LDB.
Assim, na forma integrada, atendidas essas finalidades e diretrizes, de forma
complementar e articulada, conforme o planejamento pedagógico do
estabelecimento de ensino, será oferecida, simultaneamente e ao longo do Ensino
Médio, a Educação Profissional Técnica de nível médio, cumprindo todas as
finalidades e diretrizes definidas para esta, conforme as exigências dos perfis
profissionais de conclusão traçados pelas próprias escolas, em obediência às
Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio e/ou para a Educação de
Jovens e Adultos, bem como para a Educação Profissional Técnica de nível Médio.
Como conseqüência dessa simultaneidade prevista pelo Decreto nº
5.154/2004, não se pode, portanto, organizar esse curso integrado com duas partes
distintas, a primeira concentrando a formação do Ensino Médio e a segunda, de um
ano ou mais, com a formação de técnico. Um curso assim seria, na realidade, a
forma concomitante ou subseqüente travestida de integrada. Esse procedimento,
além de contrariar o novo Decreto, representaria um retrocesso pedagógico,
reforçando a indesejada dicotomia entre conhecimentos e sua aplicação, ou seja,
entre “teoria” e “prática”. Tanto a LDB quanto o novo Decreto regulamentador da
Educação Profissional, o Decreto nº 5.154/2004, não admitem mais essa dicotomia
maniqueísta que separa a teoria da prática.
É importante deixar claro que, na adoção da forma integrada, o
estabelecimento de ensino não estará ofertando dois cursos à sua clientela. Trata-se
de um único curso, com projeto pedagógico único, com proposta curricular única e
com matrícula única. A duração do curso, obviamente, deverá ter a sua “carga
horária total do curso” ampliada, de forma a assegurar, nos termos do § 2º do Artigo
4º do Decreto nº 5.154/2004, o cumprimento simultâneo das finalidades
estabelecidas, tanto para a Educação Profissional Técnica de nível médio quanto
para o Ensino Médio, como etapa de conclusão da Educação Básica.
Para a obtenção do diploma de Técnico de nível médio, nos termos do
parágrafo único do Artigo 7º do Decreto nº 5.154/2004, “o aluno deverá concluir os
seus estudos de Educação Profissional Técnica de nível médio e do Ensino Médio”.
Paralelamente, na forma integrada, para obter seu certificado de conclusão do
Ensino Médio, o aluno deverá concluir simultaneamente a habilitação técnica de
nível médio. Como se trata de um curso único, realizado de forma integrada e
interdependente, não será possível concluir o Ensino Médio de forma independente
da conclusão do ensino técnico de nível médio e, muito menos, o inverso. Não são
dois cursos em um, com certificações independentes. Trata-se de um único curso,
cumprindo duas finalidades complementares, de forma simultânea e integrada, nos
termos do projeto pedagógico da escola que decidir oferecer essa forma de
profissionalização a seus alunos, garantindo que todos os componentes curriculares
referentes às duas finalidades complementares sejam oferecidas, simultaneamente,
desde o início até a conclusão do curso. É imprescindível, portanto, que os
candidatos a esse curso, na forma integrada, sejam informados e orientados sobre
seu planejamento, inclusive quanto às condições de realização do curso e quanto à
certificação a ser expedida.
Fica inteiramente fora de cogitação a concessão de certificado de conclusão
do Ensino Médio, para fins de continuidade de estudos, a quem completar um
mínimo de 2.400 horas em três anos, em curso desenvolvido na forma integrada
com duração prevista superior a três anos, como foi praxe adotada na vigência da
antiga Lei nº 5.692/71. Aliás, esta praxe só favoreceu a evasão de alunos dos cursos
técnicos. Se há previsão de alunos que desejarão isso, em um curso planejado para
durar quatro anos, é melhor oferecer-lhes um curso médio comum, pois, assim, não
estarão ocupando vaga indevida e excluindo os que querem se habilitar
profissionalmente.
Essa integração e simultaneidade, por outro lado, poderá ocorrer na
Educação Profissional Técnica de nível médio, tanto com o Ensino Médio regular,
quanto com a Educação de Jovens e Adultos, obedecidos os limites mínimos, em
termos de cargas horárias, tanto para a Educação Profissional Técnica de nível
médio, quanto para o Ensino Médio regular ou na modalidade de Educação de
Jovens e Adultos (EJA de Ensino Médio).
A duração dos cursos de Educação Profissional Técnica de nível médio
realizados de forma integrada com o Ensino Médio deverá contemplar as cargas
horárias mínimas definidas para ambos, isto é, para o Ensino Médio e para a
Educação Profissional técnica de nível médio. A esses mínimos exigidos, devem ser
acrescidas as cargas horárias destinadas a eventuais estágios supervisionados,
trabalhos de conclusão de curso ou provas finais e exames, quando previstos pelos
estabelecimentos de ensino em seus projetos pedagógicos.
Não há como utilizar o instituto do aproveitamento de estudos do Ensino
Médio para o ensino técnico de nível médio. Esta parece ser a lógica adotada pelo
Decreto nº 5.154/04, principalmente se examinarmos com mais atenção a sua
exposição de motivos. O § 2º do Artigo 4º do referido Decreto não deixa margem
para dúvidas. Define que, na hipótese de adoção da forma integrada, é preciso
“ampliar a carga horária total do curso, a fim de assegurar, simultaneamente, o
cumprimento das finalidades estabelecidas para a formação geral e as condições de
preparação para o exercício das profissões técnicas”. O conteúdo do Ensino Médio é
pré-requisito para a obtenção do diploma de técnico e pode ser ministrado
“simultaneamente” com os conteúdos do ensino técnico. Entretanto, um não pode
tomar o lugar do outro. São de natureza diversa. Um atende a objetivos de
consolidação da Educação Básica, em termos de “formação geral do educando para
o trabalho” e outro objetiva a preparação “para o exercício de profissões técnicas”.
Neste sentido, são intercomplementares e devem ser tratados de forma integrada,
“relacionando teoria e prática no ensino de cada disciplina” (Inciso IV do Artigo 35).
A Educação Profissional Técnica de nível médio está intimamente relacionada
com o Ensino Médio, a qual deve ser “desenvolvida em articulação com o ensino
regular” (Artigo 40) e é destinada a egressos ou matriculados no “Ensino
Fundamental, Médio e Superior” (Parágrafo Único do Artigo 39), com o objetivo de
conduzir “ao permanente desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva” (Artigo
39). Nesse sentido, pode aproveitar conhecimentos adquiridos em outros cursos de
“educação profissional, inclusive no trabalho” (Artigo 41). Com relação ao Ensino
Médio, entretanto, é diferente. Este deve garantir os conhecimentos básicos para
uma Educação Profissional de qualidade. Assim, a rigor, todo o Ensino Médio deve
ser “aproveitado” na Educação Profissional Técnica de nível médio. Ele é a base de
sustentação, indispensável em termos de educação integral do cidadão. Por isso
mesmo, quando o aluno não demonstrar ter esses conhecimentos básicos exigidos,
no caso dos cursos planejados nas formas subseqüente ou concomitante, mas sem
integração curricular, o que se deve é adicionar uma carga horária extra ao ensino
técnico para que esses conhecimentos básicos sejam garantidos. Assim, não se
trata de subtrair carga horária destinada ao Ensino Médio ou ao ensino técnico de
nível médio, considerados fundamentais para a formação integral do cidadão
trabalhador. É preciso buscar um tratamento curricular integrado que garanta isso
tudo de forma sincrônica, eficiente e eficaz.
Em resumo, na forma integrada, as cargas horárias totais dos cursos de
técnicos de nível médio organizados nos termos do § 2º Artigo 36 da LDB e do
Inciso I, do § 1º do Artigo 4º do Decreto nº 5.154/04, caso tivessem suas cargas
horárias somadas, deveriam ter, respectivamente, 3.200 horas, ou 3.400 horas ou
3.600 horas, dependendo da carga horária mínima exigida para a respectiva
habilitação profissional, nos termos da Resolução CNE/CEB 4/99, a serem
integralizadas em um tempo mínimo de três a quatro anos, dependendo do projeto
pedagógico da instituição de ensino.
Acontece que esse curso integrado entre Ensino Médio e Educação
Profissional técnica de nível médio não pode e nem deve ser entendido como um
curso que represente a somatória de dois cursos distintos, embora complementares,
que possam ser desenvolvidos de forma bipolar, com uma parte de educação geral
e outra de Educação Profissional. Essa foi a lógica da revogada Lei 5.692/71. Essa
não é a lógica da atual LDB, a Lei 9.394/96, nem do Decreto 5.154/2004, que
rejeitam essa dicotomia entre teoria e prática, entre conhecimentos e suas
aplicações.
O curso de Educação Profissional Técnica de nível médio realizado na forma
integrada com o Ensino Médio deve ser considerado como um curso único desde a
sua concepção plenamente integrada e ser desenvolvido como tal, desde o primeiro
dia de aula até o último. Todos os seus componentes curriculares devem receber
tratamento integrado, nos termos do projeto pedagógico da instituição de ensino. Por
isso mesmo, essa nova circunstância e esse novo arranjo curricular pode possibilitar
uma economia na carga horária mínima exigida, uma vez que o necessário
desenvolvimento de competências cognitivas e profissionais pode ser facilitado,
exatamente por essa integração curricular.
Em decorrência, admite-se como carga horária mínima para os cursos de
Educação Profissional Técnica de nível médio, realizados na forma integrada com o
Ensino Médio, um total entre 3.000 e 3.200 horas, integralizadas num período
mínimo entre três e quatro anos de duração, nos termos dos projetos pedagógicos
do estabelecimento de ensino, considerando os respectivos perfis profissionais de
conclusão do curso e as necessidades de propiciar formação integral ao cidadão
trabalhador. Os correspondentes planos de curso em questão devem ser
previamente aprovados pelo órgão próprio do respectivo sistema de ensino.
Nas demais formas alternativas, entretanto, não se deve admitir que haja
subtração de carga horária, tanto do Ensino Médio quanto da Educação Profissional
Técnica de nível médio. O que poderá haver será uma eventual adição, caso os
alunos que se apresentem para a Educação Profissional Técnica de nível médio não
demonstrem ter desenvolvido os conhecimentos mínimos exigidos para o adequado
aproveitamento na Educação Profissional Técnica de nível médio.
De acordo com o Artigo 6º do mesmo Decreto, os cursos e programas de
Educação Profissional Técnica de nível médio poderão ser estruturados e
organizados em etapas com terminalidade, as quais “incluirão saídas intermediárias,
que possibilitarão a obtenção de certificados de qualificação para o trabalho após a
sua conclusão com aproveitamento”. Essas “etapas com terminalidade” deverão
estar articuladas entre si, compondo “os itinerários formativos e os respectivos perfis
profissionais de conclusão” (Artigo 6º, § 2º). Conforme o § 1º do Artigo 6º, do
Decreto nº 5.154/2004, “considera-se etapa com terminalidade a conclusão
intermediária de cursos de Educação Profissional Técnica de nível médio (...) que
caracterize uma qualificação para o trabalho, claramente definida e com identidade
própria”.
De acordo com o § 1º do Artigo 3º do Decreto nº 5.154/2004, “considera-se
itinerário formativo o conjunto de etapas que compõem a organização da Educação
Profissional em uma determinada área, possibilitando o aproveitamento contínuo e
articulado de estudos”. Tais etapas com terminalidade podem ser organizadas como
cursos específicos, módulos, ciclos, blocos temáticos, projetos, alternâncias de
estudos com trabalho ou outras formas, “sempre que o processo de ensino e
aprendizagem assim o recomendar”, conforme orienta o Artigo 23 da LDB. Os
alunos concluintes de uma dessas referidas “etapas com terminalidade”, com perfis
profissionais claramente definidos, farão jus aos respectivos certificados de
qualificação técnica de nível médio, da mesma maneira que aqueles que concluírem
uma etapa pós-técnico de nível médio, como especialização, farão jus ao
correspondente certificado de especialização técnica de nível médio.
Os concluintes da Educação Profissional Técnica de nível médio que
concluírem, também, o Ensino Médio, receberão o correspondente diploma de
técnico de nível médio na respectiva habilitação profissional. Aqueles diplomas que
corresponderem a cursos desenvolvidos de acordo com a forma integrada de
organização curricular, prevista no Inciso I do Artigo 4º do Decreto 5.154/2004,
atestarão tanto a conclusão do Ensino Médio, para fins de continuidade de estudos
no nível da Educação Superior, quanto a correspondente habilitação profissional de
técnico de nível médio e, “quando registrado terá validade nacional” (Parágrafo
Único do Artigo 41).
O estágio supervisionado, quando previsto e assumido intencionalmente pela
escola como ato educativo e atividade curricular, presente na sua proposta
pedagógica e nos instrumentos de planejamento curricular do curso, deverá se
orientar pelas normas definidas pelo Parecer CNE/CEB 35/2003 e Resolução
CNE/CEB 1/2004, integrar o currículo do curso e ter sua carga horária acrescida aos
mínimos exigidos para a respectiva habilitação profissional, nos termos da legislação
específica e das normas vigentes.
Quanto à implementação dos dispositivos do Decreto nº 5.154/2004, cabe
registrar que os mesmos são auto-aplicáveis e que o referido decreto entrou em
vigor na data de sua publicação. Assim, as novas denominações trazidas pelo
Decreto Federal nº 5.154/2004 são, ou devem ser, absorvidas automaticamente nos
projetos pedagógicos dos estabelecimentos de ensino, seus regimentos, planos de
curso etc., sem necessidade de aprovação ou autorização de qualquer autoridade
educacional, pois essa nova nomenclatura provém de dispositivo de abrangência
nacional, que é um Decreto Federal regulamentador de Lei Federal de natureza
diretiva e basilar.
A instituição que continuar oferecendo cursos na forma concomitante (seja na
mesma instituição, seja em instituições distintas) ou na forma subseqüente
(anteriormente denominada “seqüencial”), e já possuir seus cursos devidamente
autorizados pelo órgão próprio do respectivo sistema de ensino e com planos de
curso devidamente inseridos no Cadastro Nacional de Cursos Técnicos de nível
médio, não têm novas providências a adotar, em função da entrada em vigência do
Decreto nº 5.154/2004, a não ser a da atualização de nomenclatura utilizada.
A instituição que pretender iniciar novos cursos, na forma concomitante
mediante convênio de intercomplementaridade, com projetos pedagógicos
unificados e, principalmente, a que adotar a forma integrada, precisará ter novos
planos de curso aprovados pelos respectivos sistemas de ensino, por se tratarem de
cursos novos, em obediência ao Decreto nº 5.154/2004.
Para oferta dos cursos de Educação Profissional Técnica de nível médio os
critérios são os seguintes:
1. o atendimento às demandas dos cidadãos, da sociedade e do mundo do
trabalho, em sintonia com as exigências do desenvolvimento sócioeconômico
local, regional e nacional;
2. a conciliação das demandas identificadas com a vocação da instituição de
ensino e as suas reais condições de viabilização das propostas;
3. a identificação de perfis profissionais próprios para cada curso, em função
das demandas identificadas e em sintonia com as políticas de promoção do
desenvolvimento sustentável do país;
4. a organização curricular dos cursos de técnico de nível médio, por áreas
profissionais, em função da estrutura sócio-ocupacional e tecnológica.
Cabe, ainda, uma orientação quanto às etapas a serem observadas pelas
escolas para a organização curricular de seus cursos e conseqüente elaboração dos
planos de curso a serem submetidos à devida apreciação dos órgãos superiores
competentes, em cada sistema de ensino e, após, serem inseridos no Cadastro
Nacional de Cursos Técnicos de nível médio, organizado e mantido pelo MEC, para
fins de divulgação dos mesmos em âmbito nacional. São elas:
- concepção e elaboração do projeto pedagógico da escola, nos termos dos
Artigos 12 e 13 da LDB;
- definição do perfil profissional do curso, a partir da caracterização dos
itinerários formativos e de profissionalização nas respectivas áreas
profissionais;
- clara definição das competências profissionais a serem desenvolvidas, à
vista do perfil profissional de conclusão proposto, considerando, nos casos
das profissões legalmente regulamentadas, as atribuições funcionais
definidas em lei;
- identificação dos conhecimentos, habilidades, atitudes e valores a serem
trabalhados pelas escolas para o desenvolvimento das requeridas
competências profissionais, objetivando o desenvolvimento de uma
educação integral do cidadão trabalhador;
- organização curricular, seja por disciplinas, seja por projetos ou por núcleos
temáticos incluindo, quando requeridos, o estágio profissional
supervisionado e eventual trabalho de conclusão de curso;
- definição dos critérios e procedimentos de avaliação das competências
profissionais constituídas e de avaliação da aprendizagem e da Educação
Profissional;
- elaboração dos planos de curso e dos projetos pedagógicos de cursos a
serem submetidos à apreciação dos órgãos superiores competentes em
cada sistema de ensino.
- inserção do plano de curso de técnico de nível médio no Cadastro
Nacional de Cursos Técnicos de nível médio, organizado e mantido pelo
MEC, para fins de divulgação em nível nacional.
II – VOTO DO RELATOR
Nos termos deste Parecer, responda-se à Secretaria de Educação
Profissional e Tecnológica – SETEC, do Ministério da Educação, quanto à
adequação às normas do Decreto nº 5.154/2004, das Diretrizes Curriculares
Nacionais definidas pelo Conselho Nacional de Educação para o Ensino Médio e
para a Educação Profissional Técnica de nível médio.
Encaminhem-se cópias deste parecer ao Fórum Nacional de Conselhos
Estaduais de Educação, ao CONSED, à UNDIME e à UNCME, visando à orientação
dos sistemas de ensino pertinentes e dos seus respectivos estabelecimentos de
ensino, relativas ao que dispõe o Decreto nº 5.154/2004.
Propõe-se à Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de
Educação a aprovação do anexo projeto de resolução.
Brasília, 8 de dezembro de 2004
Conselheiro Francisco Aparecido Cordão- Relator
III – DECISÃO DA CÂMARA
A Câmara de Educação Básica aprova por unanimidade o voto do Relator.

Sala das Sessões, em 8 de dezembro de 2004
Conselheiro César Callegari – Presidente
Conselheira Clélia Brandão Alvarenga Craveiro Vice-Presidente